A luz ao fundo do Túnel

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Parece que está quase a acabar! Dizem que em breve vai tudo melhorar e afinal já são tantas as saudades que temos de regressar.

Algures no Mundo, o João e o Karin estão cansados de tanto esperar e todos os dias perguntam aos pais quando é que isto tudo vai terminar.

Já não se consegue mais viver assim, o João está confinado em casa e não pode sair, brincar com os amigos, ir à escola, e já nem se lembra se sabe pedalar, andar de patins ou jogar à bola.

Noutro sitio distante, ou quem sabe logo ali, o Karin brinca quando pode, quando o deixam sair, quando não se ouvem tiros nem há bombas a explodir. Não sabe ler nem escrever mas sabe correr e saltar, e com os outros miúdos de rua brinca à apanhada e às escondidas sem se cansar.

O João ouve música, vê as notícias e joga computador e nas teclas do comando sonha ser um lutador. Combater o mal e ajudar os mais fracos e um dia ser um herói a valer, não ter medo de nada nem ninguém e lutar sempre pra vencer.

O Karin vê as estrelas e o céu, e na cintura usa uma arma que já disparou quando o pai adoeceu. Foi para assustar quem se aproximava com uma má intenção, e ele nunca mais se esqueceu do tremer da sua mão. O som da bala a sair estilhaçou-lhe o coração, ele quer ser amigo de toda a gente e não quer morrer como o seu irmão.

Dizem que está quase a acabar e que em breve podemos sair, visitar os amigos, voltar às lojas, aos passeios e a viajar, voltar às rotinas antigas, às festas, às jantaradas e à praia com o verão quase a começar…

As guerras vão continuar e os refugiados também, pessoas que morrem inocentes sem fazer mal a ninguém. As ruas esburacadas, os prédios a ruir, as casas abandonadas e gente que não tem onde dormir.

A poluição abrandou e a Mãe Natureza agradeceu, afinal houve coisas boas em tudo o que aconteceu.

Mas a economia está em perigo é o que já se houve dizer, e todos temos de ajudar para ela não morrer, “Consumir é preciso, comprar, comprar, comprar”… é o mote de ir para a rua para a podermos ajudar.

Era a pausa e reflexão ideal para pensar, mas em casa isolado houve quem não conseguisse parar, viram medo e incerteza em tudo o que aí vem, sentiram saudades da rotina e do stress também… e o momento perdeu-se e o Mundo vai continuar…, com a injustiça e a desigualdade, desrespeito e desumanidade, com acumulação de riqueza e ostentação de vaidade, com pessoas com fome e comida a estragar e tanta gente de novo na rotina de reclamar… dos atrasos do comboio e do café que está morno, da médica que se atrasa e do chefe que é um corno. As esplanadas a encher e o gozo de apanhar sol, o mês de maio a chegar com os petiscos e o caracol…

O João e o Karin, o meu filho e o teu, são seres inocentes que vivem num Mundo criado por adultos doentes, onde sabedoria e equilíbrio são difíceis de alcançar e a nobreza do altruísmo não se consegue comprar.

Cada um ao seu jeito tem tanto para ensinar se os pais souberem ouvir e souberem parar para escutar. Não são as regras, normas e rotinas que criam o bem-estar, é o amor, a ternura, a alegria e o saber perdoar e abraçar.

Fraqueza não é reconhecer que se errou, mas sim continuar a fazer mal e fingir ser quem não sou, atrás da minha segurança sem ajudar quem nunca me ajudou, mas precisa de mim apenas porque sim, porque sou gente, e não devo ser indiferente ao que me rodeia e faz parte de mim.

Que se dane a moral e o correto, o dinheiro e até o intelecto, se tudo o que isso significa vale zero quando estiver entubado na cama de hospital a desejar que a minha vida volte ao normal.

Que a vida volte sim a ser o que era, antes de existir ganância, poder, antes desta quimera…, e porque acreditar sempre que se pode mudar faz toda a diferença, o João e o Karin adormecem nessa crença… que tudo isto vai passar e um dia tudo vai melhorar, que o mundo será de todos os que sabem viver em paz e harmonia, e já não sofrem da doença que matava com ironia.

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